Infraestrutura terá visão integrada e liberal com Bolsonaro

Fábio Abrahão, do time de transição ao novo governo, revela mudanças em curso e indica possível reelaboração do PNL.

12 de dezembro de 2018Infraestrutura
Ao que tudo indica, a lógica de condução do setor de infraestrutura no Brasil, que passou por diversas alterações na presente gestão federal, de Michel Temer, deve viver uma guinada ainda mais acentuada no futuro governo Jair Bolsonaro. Visão integrada e liberalismo são as palavras de ordem, que vêm pautando todo o planejamento em curso, conta Fábio Abrahão. sócio-fundador do Infra Partners.

Convidado por Paulo Guedes, futuro ministro da Economia, Abrahão integra o time de transição para a nova administração e tem a tarefa de ajudar a desenhar formas de atração de investimento privado para infraestrutura logística. Nesta entrevista, concedida durante sua participação no Infra Brazil GRI 2018, ele conta detalhes do que vem sendo discutido sobre o setor pela alta cúpula que ascenderá ao Planalto. Acompanhe:


Na sua avaliação, que principais mudanças o governo Bolsonaro vai promover quando se trata de lidar com os desafios nacionais de infraestrutura?
A primeira é trazer uma visão integrada, buscando ver a logística como um todo, os sistemas, e não os ativos isoladamente. A visão de Estado [para o setor], bem ou mal, já está lá. O que falta é, de um lado, ter uma regra de priorização das iniciativas e, de outro, traduzir o que o Estado tem de executar e aquilo que se pode levar para o mercado privado. Essa separação de critérios não existe hoje e é um dos pontos que estamos trabalhando. 

O que mais merece destaque na agenda que vem sendo desenhada?
Outra transformação relevante é tentar estabelecer uma lógica realmente mais liberal. O governo passado às vezes confundiu muito o que é controlar o resultado e passou a controlar o meio. Isso leva a burocratização, cria inúmeros problemas e abre espaço para bagunça e corrupção. Controlar o meio é, no limite, replicar uma empresa. O que queremos é controlar o resultado e também estabelecer mecanismos para que o próprio mercado se regule. Essa é a beleza do pensamento liberal.

A percepção da futura gestão é de que essa nova lógica, naturalmente, acabará por estabelecer um ambiente mais favorável e atrativo ao investimento?
Não tenho a menor dúvida. Se observarmos os mercados avançados, notaremos que funcionam dessa maneira, sem o governo metendo o dedo a toda hora. Já aqui, tirando as intenções ruins, o governo achava que conseguiria prever as respostas do mercado, o que é muito complexo e inviável. Por isso, é importante deixar um ambiente liberal para o próprio mercado se regular até determinado ponto.

Em paralelo ao novo ideário, o futuro governo está anunciando uma reformulação do organograma atual, por exemplo, ao constituir um Ministério da Infraestrutura – que focará essencialmente transportes e será comandado por Tarcísio Gomes de Freitas – e uma Secretaria Geral de Desestatização. Como vê esse rearranjo?
Creio que esteja sendo bem-sucedido. Falar em Ministério da Infraestrutura juntando o de Minas e Energia não faria nenhum sentido, pois são coisas completamente distintas, ainda que haja pontos de contato – os pipelines. Vejo também muita qualidade nas pessoas que vêm se juntando [à equipe]. O próprio Tarcísio tem profundo conhecimento não só técnico, do ponto de vista das obras, mas igualmente sob a ótica legal. É um interlocutor que entende a visão do investidor privado. Noto, portanto, qualidade de pessoas e uma estrutura que faz sentido. Quando se fala de Secretaria de Desestatização, ela tem muito a ver com desmobilização e alienação. Isso de fato tem de ser feito. Não se trata de simplesmente pegar uma estatal e sair vendendo, e sim de selecionar coisas que não cabe a uma companhia dessa ter – ou pelo menos não ter 100% – e então alienar uma parte. Assim, se capitaliza a estatal. Faz todo o senso do mundo. Outra questão é pegar o imenso banco de terrenos que a Caixa [Econômica Federal] detém e não usa, e levar ao mercado. Em resumo, avalio que [o rearranjo] está bem pensado, dentro do que é possível fazer, e por isso estou otimista.

O que pode adiantar quanto ao futuro do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI)?
A maior evolução do PPI foi gerar interlocução interna no governo de forma organizada, e isso certamente vai continuar. Contudo, o que o PPI não faz – e onde entra o processo de estruturação que estamos concebendo – é justamente o planejamento de longo prazo, concatenando a parte de Estado e a associada ao investidor. Isso tem de ser mais bem construído. Também integram a evolução que estamos traçando regras de priorização e seleção de projetos, e modelagem do produto que vai ser levado ao mercado.

 

"A maior evolução do PPI foi gerar interlocução interna no governo de forma organizada, e isso certamente vai continuar. Contudo, o que o PPI não faz – e onde entra o processo de estruturação que estamos concebendo – é justamente o planejamento de longo prazo"


Pode-se esperar maior velocidade nos processos?
Sem dúvida. A vontade é essa. Quando se juntam ministérios, no fundo, um dos principais objetivos não é apenas corte de gastos, mas velocidade. Passa a haver um decisor só para algumas questões, evitando-se conflitos. Velocidade de investimento é tudo. Hoje, os dois grandes problemas da infraestrutura logística do Brasil são segurança regulatória – que passa por TCU [Tribunal de Contas da União], agência etc. – e prazos. 

Durante sua participação no Infra Brazil GRI 2018, você fez uma análise crítica a respeito do Plano Nacional de Logística (PNL), lançado há cerca de um ano. O que se pode esperar para essa ferramenta?
Para qualquer plano desses, há que se considerar o pano de fundo, e ele está agora muito mais claro do que há três anos, até porque a natureza do governo mudou. O pano de fundo hoje é de um governo sem dinheiro para investir em infraestrutura – o que torna mais complicado fazer PPPs – e uma iniciativa privada nacional também sem capital – então é preciso trazê-lo de fora. Ora, o plano do Ministério dos Transportes [que será absorvido pelo Ministério de Infraestrutura] é o do Brasil como um todo, um plano integrado. Portanto, qual deveria ser o plano do PPI? Um que considere o plano nacional e também some o olhar do cliente, que hoje e pelos próximos anos será o investidor internacional. Porém, o PNL não foi feito com essa ótica. Essa é a crítica. A partir daí, provavelmente se construiria outro plano. Todavia, lembremos que, mais do que o plano que está no papel, é importante ter a máquina funcionando, o gerador dos projetos. Isso é o mais crítico. Nesse sentido, bons exemplos são a Infrastructure and Projects Authority, do Reino Unido, e a Infrastructure Australia, máquinas que tornam viável ter um pipeline de projetos de alta qualidade nesses países.

Entrevista concedida à editora Giovanna Carnio


GRI PPPs e Concessões Brasil 2019

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